Audiência Pública debate a importância do resgate genético e cultural do porco moura 08/08/2024 - 13:34

O porco moura como patrimônio genético brasileiro foi a estrela de uma audiência pública realizada na manhã da última terça-feira (06) na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), na qual se debateu sua importância cultural e gastronômica, além do apelo comercial. O moura, também chamado de porco crioulo, é uma raça de suíno originária no Sul do Brasil.

A Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar) foi representado pelo diretor do Departamento de Saúde Animal (DESA), Rafael Gonçalves Dias. Segundo ele, a raça tem potencial para se desenvolver muito mais no Estado. “O desafio é estabelecer medidas de biosseguridade para evitar a entrada e propagação de doenças nas propriedades, pois o sistema de criação ao ar livre requer medidas específicas”, orientou.

Dias citou ainda o protagonismo do Paraná na suinocultura e na produção de alimentos. Na cadeia de suínos, o Estado produziu 12 milhões de unidades em 2023 e ocupa a segunda posição no ranking nacional, com 21,2% de participação, de acordo com dados divulgados em março pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). “É um resultado do trabalho de muitos anos, que assegurou o certificado de livre de febre aftosa sem vacinação e declarou o Estado área livre de peste suína clássica independente”, comentou.

O chefe do Departamento de Saúde Animal reforçou que a Adapar trabalha na construção de uma legislação específica para o tema. “Reconhecemos que a diversidade da nossa suinocultura é uma força, não uma fragilidade. Nosso objetivo é organizar melhor o setor, e isso exige ações como a normatização e a valorização da cadeia produtiva”, afirmou.

“Uma lei bem aplicada deve refletir o DNA do seu público-alvo, e é com esse pensamento que a Adapar está desenvolvendo uma portaria específica para criações não industriais de suínos, incorporando suas características de produção”, completou.

A Adapar também está estudando e categorizando as criações de suínos em níveis de exigências sanitárias, conforme a quantidade e a forma de produção. Segundo Dias, áreas sem regulamentação normativa estão sujeitas a instabilidades passageiras. Por isso a importância de ampliar o nível de organização de uma cadeia produtiva e reforçar a interação entre o serviço público e o privado.

“Nossa primeira normativa tem a intenção de ‘blindar' na medida de sua realidade essas atividades que tanto valoram e edificam a diversidade produtiva da nossa agricultura paranaense” completa Dias.

O chefe de Divisão de Sanidade dos Suínos da Adapar, João Humberto Teotônio de Castro, informou que está para ser divulgada pela agência paranaense a primeira portaria do Brasil sobre o assunto, em trabalho conjunto com a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). “Ela estabelece exigências básicas de biosseguridade para a suinocultura não tecnificada e de subsistência”, afirmou Teotônio.

A portaria de biosseguridade básica para a criação do porco moura estabelecerá níveis adaptados ao número de animais, permitindo uma melhor adequação das exigências para cada tipo de produtor.

DESTAQUE — Entusiasta e criador da raça na região dos Campos Gerais, onde desenvolve uma reserva genética ao longo dos últimos dez anos por meio do manejo extensivo de alta qualidade, Herculano Lisboa disse que o Paraná está deixando um legado no setor.

“Ele está no Brasil há mais de 500 anos e se adaptou. Nosso porco não fica doente, não é vacinado”, frisou Lisboa, que também é farmacêutico e bioquímico de formação. A criação foi implementada em sua propriedade com o apoio e orientação do “Projeto Porco Moura” sob comando do professor Marson Bruck Warpechowski, da UFPR.

“O porco moura tem um ótimo apelo comercial, é um patrimônio brasileiro que precisa ser preservado. É reconhecido como um animal único, é um produto do nosso meio, com origem genética espanhola”, lembrou o docente, que também participou do debate. Trazida ao Brasil por portugueses e espanhóis durante o período colonial, o moura quase entrou em extinção nos últimos anos.

RESGATE — A zootecnista Maria Marta Loddi, professora da UEPG, explicou o processo de resgate. “Fizemos um mapeamento no Paraná, onde existiam poucos núcleos de criadores, e introduzimos materiais genéticos de Santa Catarina, da Embrapa, e do Rio Grande do Sul. Dessa forma aumentamos o número de criadores no Estado e estamos salvando a raça da extinção”, informou. O resgate da raça é um dos focos de projeto da UEPG, em parceria com a UFPR.

“Valorizar a biodiversidade é de suma importância”, afirmou o agricultor Divo Molinnari, que preside a Associação Paranaenses de Criadores de Porco Moura. Para ele, é essencial que as instituições públicas ofereçam apoio técnico e financeiro para os criadores poderem dar continuidade às atividades em suas granjas. “Enfrentamos muitos desafios”, enfatizou, ao considerar o debate um momento histórico para o setor.

RAÇA — O porco moura, originada no Brasil a partir dos porcos domésticos trazidos no início da colonização, é uma raça criada ao ar livre, sem confinamento, e pequenos rebanhos já foram identificados em pelo menos 21 municípios do Paraná, principalmente no Sul, Sudoeste, Campos Gerais e Centro do Estado, além da Região Metropolitana de Curitiba. A raça predominante no Sul do País é tradicionalmente criada de maneira rústica, solta em pastagens e florestas nativas.

As características marcantes dos suínos atraem cada vez mais chefs de cozinha e açougues gourmets. Com peso adulto de até 300 quilos, o moura é uma das maiores raças em tamanho no Brasil. Tem pelagem escura entremeada de pelos claros e uma estrela na testa que lhe dá nome em algumas regiões.

SEAGRI — Participaram da audiência representantes do Sistema Estadual de Agricultura (Seagri). Estiveram na audiência Breno Menezes de Souza, diretor do Departamento de Florestas Plantadas da Secretaria da Agricultura e Abastecimento (Seab); Diniz Dias, diretor interino do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná-Iapar-Emater (IDR-Paraná).

Colaboração: site Alep